Por Luiz Paulo Vellozo Lucas
Uma antiga piada de português conta que seu Manuel foi perguntado por um amigo: “Sua esposa Maria faz sexo contigo por amor ou por interesse?” Ao que Manuel respondeu: “Deve ser por amor pois ela não demonstra nenhum interesse.”
O Presidente da Câmara dos Deputados Hugo Motta resgatou um projeto de emenda constitucional elaborado pelo Senador Jose Serra, para introduzir no Brasil o voto distrital misto. Metade dos deputados, federais, estaduais e dos vereadores de cidades com mais de 200 mil eleitores, seriam eleitos por distrito em eleições majoritárias. A outra metade dos representantes seriam eleitos em listas partidárias pré-ordenadas. O eleitor ao votar estaria votando ao mesmo tempo em seu candidato no distrito e em seu partido politico no estado.
O jornalista Elio Gaspari, em sua coluna d’O Globo, chamou esta proposta de golpe das elites partidárias contra os puxadores de votos. Outros analistas contrários à proposta lembraram que o desenho dos distritos, a ser feito pela justiça eleitoral, é um desafio com dificuldades que não podem ser subestimadas, havendo o risco de manipulação, suspeitas e consequente perda de credibilidade do processo eleitoral.
No período do regime militar as regras eleitorais eram impostas afim de manipular o resultado do pleito em favor do partido do governo, a ARENA e assim controlar as eleições indiretas para presidente e governadores.
A oposição extremista pregava o voto nulo e a luta armada usando o argumento que o regime nunca seria derrotado num processo eleitoral com regras estabelecidas por eles mesmos. Também hoje é grande a descrença numa reforma política formulada pelos maiores interessados, os próprios políticos. A eleição de Tancredo Neves mostrou ser possível ganhar mesmo com regras desiguais.
A revolução tecnológica da internet e a universalização dos meios digitais transformou todas as atividades humanas, notadamente a economia, a luta pelo poder e a comunicação política. As cúpulas partidárias que já controlam os fundos partidários e as emendas de orçamento, tem dificuldade em montar nominatas, chapas de candidatos a deputado, e assim buscam a formação de federações partidárias e tentam atrair celebridades de fora da política.
A competição pelo poder no Congresso Nacional se apresenta, na ante véspera das eleições de 2026 dentro deste contexto, que o projeto de Hugo Motta pretende alterar para pleitos futuros.
Profissionais de comunicação, jornalistas, radialistas, esportistas, artistas e apresentadores de televisão há muito são atraídos pela vida pública. Médicos, professores, militares, profissionais da área da segurança pública e advogados também. Empresários, lideres religiosos, militantes de movimentos sociais e associativos permitem alta visibilidade e potencial eleitoral. Com o voto distrital misto se fortalecem as lideranças locais de todas as origens e a elite partidária e perdem importância relativa as celebridades e os influenciadores famosos.
Não acredito que a implantação deste novo sistema seja uma “bala de prata” contra as práticas políticas de baixa qualidade, patrimonialistas e fisiológicas. No entanto o resultado pode resultar de fato em uma maior proximidade dos representantes políticos do seu eleitorado e maior confiança nos mandatos eletivos e no sistema democrático.
Mesmo que a intenção do deputado Hugo Motta não seja a mais “nobre” o resultado pode ser positivo. Definitivamente, não é uma reforma proposta por amor mas por interesse das elites partidárias. Ainda assim, pode funcionar para aumentar a credibilidade das instituições.
A reforma mais importante que precisa ser feita no sistema politico brasileiro diz respeito ao funcionamento do sistema orçamentário e a disputa por recursos públicos. A simples condenação moral indignada com as emendas parlamentares só faz aumentar o mal funcionamento do sistema, as suspeitas e o abismo de confiança. É preciso formular e implantar um novo sistema orçamentário tecno político, pactuado no Congresso Nacional com as instâncias de poder subnacionais, informado por estudos, diagnósticos e orientações técnicas para as escolhas e decisões políticas.
Recuperar credibilidade e confiança na politica e nos políticos é do interesse das lideranças partidárias que hoje controlam e manipulam as emendas. São eles que podem liderar e produzir esta reforma, mesmo que seja, em tese, contrária aos seus próprios interesses.
O medo da desmoralização e de escândalos policiais pode fazer com que os políticos empreendam, por interesse, reformas institucionais positivas como o sistema distrital misto e um novo sistema orçamentário.
Fica até parecendo que é por amor.
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Engenheiro, Mestre em Desenvolvimento Sustentável, ex-prefeito de Vitória-ES e membro da ABQ-Academia Brasileira da Qualidade.
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